O cenário hipotético
Esqueçamos o FC Porto, por momentos. Coloquemos o nome de uma empresa fictícia para exemplificar o absurdo. «Abutre & Irmãos, Lda», para condizer com o estilo e a forma.
Ora, imaginemos que a firma supracitada produz tijolos de grande qualidade, matéria-prima de excelência, e que vive/sobrevive fundamentalmente das exportações. Especializada no ramo, certamente terá contactos preferenciais, recetores de confiança. E terá, com toda a certeza, funcionários com capacidade de gerir diretamente o processo, sem intermediários que suguem parte do lucro e atrapalhem/bloqueiem o envio da mercadoria.
O absurdo tornado realidade
Agora, num cenário estapafúrdio, coloquemos a «Abutre & Irmãos, Lda» a transacionar ladrilhos de primeiro nível, para um destino habitual. E, ao contrário do que é suposto e aceitável no mundo da construção civil, a entregar 36 por cento do valor conseguido a um middle man.
Para alguma empresa, do ramo da construção ou do ramo desportivo, recorrer a intermediários tão bem ressarcidos, só há duas explicações possíveis: ou a companhia assume a absoluta incompetência dos seus funcionários oficiais ou deve favores ao intermediário e compensa-o através desse saque ao valor total dos negócios.
O assalto ao FC Porto
Seja como for, qualquer um dos cenários é assustador. E, já agora, absolutamente reais. Verificaram-se no FC Porto ao longo dos últimos anos, perante o beneplácito e a complacência dos órgãos sociais eleitos.
Sejamos claros: o clube foi assaltado e foi assaltado em muitos milhões. A auditoria forense, nesta altura a ser realizada, colocará os nomes dos responsáveis em evidência.
O papel de Pedro Pinho
À boleia do excelente trabalho feito pelos jornalistas Pascoal Sousa e Paulo Pinto, no jornal A Bola, recupero dados relativos a essa gestão passada. Uma gestão de incompetência evidente, danosa e perigosa. Dolo ou crime? Os auditores o dirão.
Certos, porque inscritos nos vários Relatórios e Contas, são os prémios comissionistas exagerados e desajustados atribuídos a empresas e agentes próximos à direção de Pinto da Costa. Aqui, uma vez mais, destaca-se o senhor Pedro Pinho. Desconheço a competência (ou falta dela) do indivíduo, mas a conclusão é simples: o homem tinha o FC Porto na mão e usufruía de uma relevância, aos meus olhos, promíscua e incompreensível.
Os negócios ruinosos
Olhemos os números, uma vez mais: Pinho e as suas empresas encaixaram 7,5 milhões de euros (sete milhões e meio de euros, assim, por extenso, para que todos possamos ler sem dúvidas) na intermediação de negócios sem fim, sendo que na esmagadora maioria dos mesmos não era nem empresário do futebolista, nem funcionário dos clubes envolvidos. Notável, de facto.
Os tais 36 por cento, exemplificados na forma de absurdo, entraram mesmo na conta de Pinho. Aconteceu na mudança de Sérgio Oliveira para o Galatasaray, um processo tristemente famoso por ter resultado em… menos-valias para o FC Porto. Não há engano. Oliveira deixou o Porto, partiu para Istambul e o Dragão perdeu (!) 821 euros. O negócio foi avaliado em três milhões de euros, mas o dinheiro esfumou-se em custos de intermediação, mecanismo de solidariedade e, claro, uma comissão de 1,082 milhões para o amigo Pinho - a saída de Marchesín para o Celta também é histórica, por ter gerado menos-valias de 989.259 euros.
A venda de Otávio é outro escândalo. Estou a medir bem as palavras, as sílabas, as letras. Um escândalo. Dos 60 milhões acertados entre FC Porto e Al Nassr, os depauperados cofres dos dragões receberam pouco mais de metade. Para Pedro Pinho seguiram 28 por cento – 17 milhões de euros, para que não haja dúvidas.
Conclusão
A pornografia financeira e o saque organizado levaram o FC Porto à pré-ruína. Isto é claríssimo e a autópsia às contas irá prová-lo. Claro que o novo portal de transparência, pese todos os seus méritos, pode e deve ser melhorado. Os sócios têm o direito de saber, em detalhe, todas as ações decididas pela direção eleita. O caminho certo é esse e merece ser imitado por Benfica, Sporting e restantes emblemas nacionais.
Não me desvio do essencial: depois de serem autores, co-autores ou simples facilitadores de escândalos atrás de escândalos, os senhores que geriram o FC Porto na última década tinham a obrigação de pedir desculpa e aguardar em silêncio. A «Abutre & Irmão, Lda» existiu mesmo. E vestiu de dragão azul anos a mais.