O último adeus de um ícone
Eram 13h24 de um dia de luto no Porto quando os sismógrafos da região de Lisboa registaram um abalo de 4,7 na Escala de Richter. A mais de 300 quilómetros de distância, aquele tremor de terra parecia ser um sinal do além: Pinto da Costa, o «Presidente dos Presidentes», fazia a capital tremer uma última vez.
Por vontade do seu sucessor, André Villas-Boas, e da família de Pinto da Costa, o Estádio do Dragão abriu as portas para receber o caixão do homem que liderou o clube durante 42 anos, ladeado por 26 troféus conquistados em diversas modalidades. Nenhum membro da atual direção do FC Porto se juntou aos mais de 15 mil adeptos que encheram as bancadas, por vontade expressa de Pinto da Costa.
Uma despedida com honras de Estado
A cerimónia de despedida teve dois epicentros unidos pela Alameda das Antas: o Estádio do Dragão e a Igreja de Santo António das Antas, onde decorreu a missa de corpo presente presidida pelo Bispo do Porto, D. Manuel Linda. Na homilia, o cardeal D. Américo Aguiar fez uma alusão ao abalo sísmico registado em Lisboa, como que a adivinhar o simbolismo daquele fenómeno natural que muitos evocaram como paranormal.
«Ele agora vai interceder junto de Deus. Em termos desportivos não, porque penso que Deus não se mete nessas coisas. Mas se virem outras coisas estranhas a acontecer, já sabem… foi ele», disse D. Américo Aguiar.
Ao longo do cortejo fúnebre, que seguiu da igreja até ao crematório do cemitério do Prado do Repouso, passaram figuras como o primeiro-ministro Luís Montenegro, o ex-Presidente da República Ramalho Eanes e antigos craques que alcançaram as maiores glórias pelo clube, como Deco, Futre, Ricardo Carvalho, Maniche, João Moutinho, Pepe, Sérgio Conceição e António Oliveira. Faltaram, no entanto, os rivais de Lisboa, que não se fizeram representar nem emitiram qualquer nota institucional.
O legado indiscutível de Pinto da Costa
Pinto da Costa morreu duas vezes: a primeira quando, a 27 de abril de 2024, perdeu o seu propósito de vida durante longos 42 anos, com o fim da sua hegemonia no clube. Mais do que presidente, era um baluarte da contestação ao centralismo, que apoiava ativamente instituições da cidade e da região. Provocador, inconformado, orgulhoso, astuto, culto e bem-humorado, Pinto da Costa era uma personalidade complexa e divisiva, com polémicas quase tantas como as conquistas.
Apesar das controvérsias, Pinto da Costa deixa um legado incontornável na história do FC Porto. Para muitos adeptos, a oportunidade que o clube lhes deu de tocar o céu e conquistar troféus que antes pareciam um sonho inalcançável para um clube português é algo que jamais será esquecido. Como disse um jovem adepto, que veio de Barcelos acompanhado pelo cunhado: «O meu avô morreu em 2020. Foi ele que me ensinou a ser portista. Ele adorava o Pinto da Costa. E eu vim aqui também por ele, prestar-lhe esta homenagem.»