No dia 5 de dezembro de 2000, um evento icónico na história do futebol português estava prestes a desenrolar-se. Comemorava-se exatamente 25 anos desde que José Mourinho, num momento que converteria a rivalidade entre Sporting e Benfica, esteve a minutos de se tornar treinador do Sporting. A situação estava tão tensa que o próprio Mourinho mais tarde admitiria que, naquele momento, o destino estava mais próximo de um impasse do que de uma resolução.

A história começou dois dias antes, após um dérbi analisado e comentado durante semanas. O Benfica, após uma vitória contundente de 3-0 contra o Sporting, tinha sido o cenário perfeito para Mourinho desafiar a direcção encarnada: “Mourinho contou mais tarde, no primeiro livro que lançou, que aproveitou a vitória no dérbi para encostar Manuel Vilarinho à parede”. A partir desse ponto, a bola de neve da revolução começou.

A Decisão de Luís Duque

O presidente do Sporting, Luís Duque, de forma calculada, decidiu então agir. Ao sentir uma cisão no plantel do Sporting, começou a ponderar o futuro da equipa técnica. “Mourinho tinha uma admiração que até já tinha partilhado com José Veiga”. Este contacto não só multiplicou esperanças, mas também gerou uma expectativa crescente, culminando numa reunião clandestina.

Quando Duque e o diretor-desportivo Carlos Freitas se encontraram com Mourinho numa madrugada de segunda-feira, o nível de detalhe do treinador deixou uma impressão marcante: “Mourinho já sabia ao que ia e levou para o encontro um dossier com fichas completas de todos os jogadores do plantel leonino”.

A Lealdade a Benfica

Contudo, a lealdade de Mourinho ao Benfica não poderia ser ignorada. Em conversas subsequentes, ele deixou claro que “a prioridade dele é o Benfica”. Enquanto o Sporting sonhava, Mourinho negociava com o Benfica, insistindo que a ausência de confiança na sua posição era preocupante. “Diz que, perante as notícias que têm saído sobre o desejo de fazer regressar Toni, é necessário reforçar a posição dele”.

Os ânimos começaram a acirrar, e com uma mistura de telejornais e rádio a dar conta da crescente tensão, muitos adeptos se mobilizaram. “Alarmados com as notícias que vão chegando de mal-estar, multiplicadas pela entrevista de Mourinho à Bola Branca, dezenas de sócios do Benfica dirigem-se ao Estádio da Luz”, numa manifesta exaltação da paixão por parte dos torcedores.

A Demissão de Mourinho

Quando finalmente Mourinho apresentou a sua demissão ao Benfica, fez-no sob aplausos e aclamações: “Dissemos à direção do Benfica que só continuaríamos se renovássemos o contrato por mais uma época”. O seu discurso na sala de imprensa foi memorável e tomou uma proporção que se manteve viva na memória dos adeptos.

Marcando uma viragem, enquanto Mourinho se despedia do Benfica, as mesmas emoções fervorosas invadiam Alvalade. Ao entrar na sala de imprensa ao lado de Inácio, Duque teve imediatamente de enfrentar o clamor da massa: “O Mourinho não. Isso nunca na vida. O Mourinho nunca.”

A Saga das Rivalidades

Dessa forma, a história de como Mourinho se tornou um dos grandes treinadores da história estava quase a ser escrita de forma diferente, mas uma conjugação de valentia, incertezas e a lealdade inabalável dos adeptos para com os seus ídolos eventualmente mudaram os ventos do destino. Por um golpe do acaso, as datas e os momentos não se alinharam, mas a saga de rivalidades permanecerá.