Paulo Alves: "Estou à espera que surja esse desafio, lutar por títulos"

  1. Depois de uma passagem de sucesso pelo Moreirense, Paulo Alves vê algumas portas a fecharem-se
  2. Foi campeão do Moreirense e eleito treinador do ano na II Liga
  3. Aceitaria novamente o projeto do Lugo, apesar de não ter corrido bem
  4. Diz que não teve má relação com ninguém no Moreirense, mas que algumas pessoas o afastaram
  5. Considera-se um treinador simples e objetivo, mas atualizado com o futebol moderno

Depois de uma passagem de sucesso pelo Moreirense, Paulo Alves vê algumas portas a fecharem-se. O treinador, que foi campeão da II Liga e eleito o treinador do ano, não conseguiu manter-se no clube após a descida, algo que o deixou magoado. Agora, procura o próximo desafio, mas admite que só aceita projetos em que possa lutar por títulos.

Lugo: "Teria aceitado"


«Nesta altura o que posso fazer é ir acompanhando o que se passa no futebol, estar por dentro da realidade das equipas da primeira e segunda liga, para quando surgir a oportunidade ter conhecimento de todas elas.», começou por dizer Paulo Alves.


Questionado sobre o projeto do Lugo, que não correu da melhor forma, o treinador foi claro: «Teria aceitado. Foi um projeto que me aliciou bastante, de um clube que tinha estado cerca de 15 anos na segunda liga, um clube com muita história, com muito apoio popular, e o desafio era muito interessante e passava por fazê-los regressar à segunda liga espanhola. Mas o que aconteceu depois foi surreal, porque demos a volta a uma sequência negativa e ao fim de uma série de dois empates e duas vitórias decidiram mudar de treinador. Até hoje não me explicaram a razão, não sei o que aconteceu, sinceramente. Mas voltaria a aceitar.»

Moreirense: "Não tive má relação com ninguém"


Depois de ter sido campeão no Moreirense e de ter sido eleito o treinador do ano na segunda liga, Paulo Alves não viu o seu contrato renovado. «No futebol, para mim, não há mágoas. Sou um treinador muito simples e objetivo. O problema é que ofuscámos algumas pessoas, que até tiveram responsabilidades na descida, e que, pela influência que têm no clube, arranjaram forma de que eu não ficasse.»


O treinador garante que «não tive má relação com ninguém», e lamenta que «passam a imagem de que sou um treinador desatualizado, questionam os meus métodos. Mas eu pergunto: como é que um treinador que consegue o que eu consegui, sendo campeão e batendo todos os recordes, com maus métodos? Isso não existe.»

Jogador moderno: "Exigente, questiona muito"


Paulo Alves vê diferenças entre as gerações de jogadores com que lidou. «O jogador de hoje é um jogador mais exigente no trabalho, tem à volta um staff que o apoia, nem sempre bem, mas que lhe define o trabalho que tem de fazer.»


E explica: «O problema é que se confunde a simplicidade com essa tal desatualização. Isso hoje está um bocadinho enraizado no futebol. Se um treinador não consegue explicar uma situação simples de jogo como se fosse um cirurgião a explicar um processo cirúrgico, está desatualizado. Isso não é assim.»

Sucesso no Moreirense: "Fiz tudo de raiz"


Questionado sobre o seu contributo para o sucesso do Moreirense, Paulo Alves foi modesto: «As pessoas têm de perceber que sou low-profile, não sou de me pôr em bicos de pés. Hoje julga-se mais pela embalagem do que pelo conteúdo e há pessoas que têm mais capacidade para se vender. Eu, quando chego ao Moreirense, não tinha nada para agarrar. A equipa estava completamente destruída, tive de fazer tudo de raiz.»


O treinador deu o exemplo de Gonçalo Franco: «Quando fomos treinar, começo a ver o Franco a correr para todo o lado, a pressionar os centrais, a pressionar o guarda-redes. Tive de definir e ajustar o que o Franco tinha de fazer, a delimitar o raio de ação. Os dados de GPS baixaram substancialmente, mas a época começou e logo no mês de Agosto o Franco ganha o prémio de médio do mês e faz uma época extraordinária.»

Escolha de projetos: "Jogar por títulos é muito estimulante"


Paulo Alves é agora mais criterioso na escolha dos seus projetos. «Defini para mim que, depois do ano do Moreirense, jogar por títulos é muito estimulante e motivador. Já recusei alguns projetos onde senti que seria difícil atingir essa bitola. Não tem a ver com orçamentos ou os nomes de equipas.»


O treinador revela que «estou à espera que surja esse desafio, que acredito que vá acabar por surgir, porque é o que realmente me estimula, lutar por títulos. Sei exatamente como se chega lá.»

Gestão de homens: "A charneira de uma equipa de futebol"


Apesar das novas tecnologias e da ciência aplicada ao futebol, Paulo Alves considera que a gestão de homens continua a ser fundamental. «Sim, por isso é que eu digo que há gente para tudo. Mas a gestão mental ainda é a charneira de uma equipa de futebol. Podemos ter essa tecnologia toda, se não conseguirmos gerir um balneário e colocar toda a gente no mesmo caminho, não vamos conseguir.»


E dá um exemplo do Moreirense, em que ignorou os dados do GPS para não afetar a mentalidade dos jogadores: «Só vamos atingir estes valores quando tivermos o grupo fechado, com 20 e poucos jogadores, e a partir daí sim, após três ou quatro semanas vamos atingir esses valores. Ao fim dessas semanas estavam-me a dar os parabéns porque tinha gerido bem.»

Passagem pelo futebol árabe


Paulo Alves teve uma passagem pelo futebol árabe, na Arábia Saudita, numa fase diferente do atual boom. «Era uma fase diferente, não tinha este investimento. Já lá estava o Jorge Jesus, mas sem esta dimensão de agora. É um futebol essencialmente de televisão. Cheguei a fazer jogos de 100 espectadores no estádio.»


O treinador considera que «é muito difícil fazer de um árabe um grande profissional, porque não tem essa paixão. Toda esta leva de jogadores que vai para lá é para tentar dar outra mentalidade.»

Episódio no Irão: "Situação surreal"


Paulo Alves também passou pelo Irão, numa experiência caricata. «Foi uma situação surreal. Foi um clube de segunda liga, que estava a fazer uma aposta muito grande para subir de divisão. O presidente era uma pessoa com muito dinheiro e queria fazer o clube regressar à primeira divisão 30 ou 40 anos depois. Entretanto vim a perceber, através do meu intérprete, a contrapartida do presidente do clube para voltar a trazê-lo para a primeira liga era que a câmara lhe cedesse uns terrenos para construir um estádio novo e uns prédios, onde faria permuta e negócio.»


Após um jogo em que ganharam, o presidente «aproveitou essa situação e foi à câmara exigir esses terrenos, mas não lhe foi feita a vontade. O homem chateou-se e fechou a porta. Disse a toda a gente: «Não ponho aqui mais dinheiro. Quem quiser ficar fica, quem não quiser não fica». Ainda fiquei mais 15 dias, para ver se as coisas se compunham, mas ao fim de 15 dias começámos a ter problemas de pagamentos e vim embora.»

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